A vida o move a cuidar-se e a do prado:
O fogo e o pala; o sabão e a navalha;
A bota e o chapéu; a enxada e o trato;
Não qu’ela, no entanto, só disso se valha.
Seu tempo carece da lida do peito:
Qual faca sem cabo. animal sem cuidado:
Quão mais esquecida, mais fere o trejeito.
Seus dias anseiam: sê o peito zelado!
De mui males e cangas que o busto suporta,
Há aqueles ocultos no fundo da mente:
Não cortam o braço; não talham a bota;
Tais males fustigam de ontem pra frente.
Senões provindos dos olhos do juízo;
Brotam do ouvir que a gente permite.
Não vêm pelo outro, ou do laço puído:
É a mente que mente, se tal se admite.
A razão do peão é sujeito às prosas,
Às várias que houve na história da alma.
Nas doma, encilhas, colheitas e tosas,
O verbo nos molda e a aragem acalma.
Que é o verde, do campo, diante de si?
Quem é, em verdade, esse a sua frente?
Será qu’ele vê o quanto cresci?
Ou vê-me “meu ontem”, assim, tão somente?
Espero, mormente, por sua saúde,
Que abra o cerne em busca do eu,
Paciente e ousado, sua alma desnude,
Solvendo as dores que ela sofreu
Moldando, a seu tempo, o ver e o ouvir
A respeito daqueles que co’ele convivem,
Pois deles dependem seu próprio porvir;
Pra que as flores da alma lhe sempre cultivem…
Escrito em virtude do aniversário de meu irmão.
A imagem no topo desta página é a pintura "Pousada de carreteiros", pintado pelo pintor gaúcho Pedro Weingärtner em 1921; Saiba mais sobre Weingärtner aqui.